sábado, 23 de abril de 2011

Carta a um irmão em liberdade

E aí meu irmão, ta tudo bem?
Por aqui tudo anda aos tropeços
Sabe como é, essa tal de realidade é dura
E não só a que me cerca o dia inteiro
Mas também daquela interna e dolorosa
Essa angústia necessária pra viver.


No mais, lembra daquela boa senhora,
A Dialética, uma mulher de meia-idade,
Companhia dos nossos cafés noturnos lá no posto?
Então, parece que ela tem fama por aqui.
Os tais companheiros dizem gostar muito dela.
Falam sobre ela algumas vezes, quando se reúnem
Que ela pode fazer isso ou aquilo onde passa.


Na verdade, ela realmente tem nos visitado,
Mas todas as poucas vezes em que a vejo,
Em nenhuma é na companhia deles.
Bom, você sabe como é o ser humano
Uma pessoa muito ilustre como essa senhorinha
É muito bom dizer que dela é um conhecido
Ou que ela surge como alguém sempre frequente
Seja em atos, reuniões ou rodas de discursinhos


Enfim, um dia me confundiram com o Neoliberal
Acredita? Você sabe que não suporto esse cara
É só falar de liberdade e consciência
E os companheiros sentem um leve desconforto
Parece que pra eles não importa mais ser livre
Somente alienado, mas com os valores certos


Te falo disso meu amigo, pois se uma pessoa como eu
Já é pra eles semelhante àquele estranho
Esteja bem preparado, pois tem uma outra senhora,
Essa sim da qual sempre retomam, e parece ser impetuosa.
Revolução o nome dela, dizem que uma dia ela chega
Deve vir de muito longe, pois pelo que me parece,
Já faz mais de um século que ela está na estrada.


A filha mais velha dela, a Vanguarda,
Até foi ver se a mãe não se perdeu pelo caminho.
Eu fico imaginando como será a senhora Revolução
Se ela for bem parecida com a filha, estamos mortos.
Nunca vi alguém tão convencida quanto essa tal Vanguarda.
Acha que sabe exatamente o que é melhor para as pessoas,
Que elas não sabem nem cruzar a rua sem pegar na sua mão.


Nossa, só agora, te escrevendo tudo isso,
Percebi o porquê da boa Dialética não andar com a galera.
Você acha mesmo que a Vanguarda iria se sentir bem com ela?
Mas nunca!
Ela não é boba, sabe que a Dialética é sábia, simpática e atraente,
Jamais aceitaria alguém que roubasse sua atenção


Bom, não vou me prolongar, marquei um café com a Dialética.
Dentro em breve lhe escrevo novamente contando mais fofocas.
Em um dos nossos rápidos encontros, ela diz que tem visto você.
Nas palavras dela: tá corado aquele garotinho!
Pelo jeito você tá fazendo bom uso das receitas que ela nos passou
Aqui to tentando fazer elas do jeito certo, mas tem faltado fermento
Se cuida, e escreve seu maldito!

Resposta a um irmão em liberdade 25, abril, 2011 - 10.57am

Meu irmão, há quanto tempo
Há muito que esperava essa carta
Pensei mesmo ter sido censurada mas
Por sorte estamos em outros tempos;
Infelizmente não aproveitamos
As “liberdades” do momento.

Pois meu irmão, aqui quase não ouço falar da Sra. Dialética,
Só tenho lha percebido pelos cantos
De um ou outro aedo
Mas como causa susto e provoca medo
Na sequencia vem um nome santo
Para excomungar o pecado da falta de ética.

Por quê aqui também se fala muito da dona Revolução,
Mas aqui quem fala muito dela é sua filha bastarda
Que chama a si mesma de Vã-guarda
Muito amiga da Intolerância e do Segredo
Para quem sempre a justiça para todos falha
Assim que suas ações se enquadram em uma só Reação.

Não é a toa que te confundem com o famigerado Neoliberal
qualquer palavra que pareça com “liberdade”
já lhes é semelhante à origem de todo mal
Esses camaradas só o são, na verdade,
até que obtenham o poder real.
o desejo de poder é a fonte da inimizade
e é a inimizade a fonte de parte do mal.

Como velho irmão que de longe aconselha
que autonomia é tudo, sei que vai se lembrar
que arquiteto do mundo é quem as trevas clareia
portanto não se deixe levar
por qualquer chama que no fim é centelha
sábio daquele que
mesmo sem fogo incendeia as candeias

No mais meu irmão, aproveito a falta braços
para remendar o que me falta de entendimento:
não quero mais cometer o erro crasso
de achar que a todos bastam o sentimento
a afeição e o vislumbre da liberdade
por si mesmos movimentem o pensamento
com a língua afiada e o coração de manteiga faço
estruturas de aço prum mundo feito daquilo que penso

Não vou me alongar muito nessa carta
sei que estás na correria
- parece que o mundo pra quem quer mudá-lo
se pudesse ao inverso giraria!
De qualquer forma deixo a ti um abraço
de quem muito te quer em companhia
de um “fabuloso capuccino de algas”
- agora a censura pensa que falamos por enigma!

ps: Se falta fermento, tenho pólvora - e cafeína!

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