sexta-feira, 8 de abril de 2011

Se nossos olhos fossem espelhos, Ai de nós...

Estaríamos escrevendo nossas próprias biografias... mas teríamos orgulho delas?


Na sociedade do espetáculo, somos levados a acreditar que podemos ter muitas vidas dentro de uma só. A cada cinco anos posso mudar de pele. A cada ano decido que tipo de professor quero ser, que tipo de filho, que tipo de mãe, que tipo amante, de esposa... tudo com a suave ilusão de que está-se livre (democrática e liberalmente livre!) para se ser o que quiser. Na verdade, por baixo de todos os figurinos que o sistema lhe permite encarnar estão as camisas-de-força do Consumidor. É esta condição que, nessa sociedade, permite que sejamos o que quisermos, desde um punk revoltado (com a camisa do sex pistols) ou um socialista saudosista (com a camisa do Che).

Mas... sob todas as roupas que nos vestiram - em nossas peles - o que está inscrito?

Vamos vivendo, olhando somente para o que estamos parecendo no palco. Não estamos de olho em nosso passado – imagine se no futuro! O que queremos que nossas vidas se transformem? O que estamos planejando para deixar com os outros? Que idéias eu, miserável eu, estou propagando pelo mundo? É o papel que eu queria? Ou é o que sou?

A questão é muito mais complicada. Tão complicada quanto chegar-se à frente do espelho para tirar a maquiagem dos papéis que interpretastes durante o dia, e de súbito, ver tua face escorrendo pelo ralo da pia. Esquecemos nossa face, esquecemos de quem somos = nossas vidas não nos pertencem mais.

Será que você é capaz de escrever sua biografia – mas não simplesmente olhando para o passado (essa seria a parte mais fácil), mas olhando para o futuro? É favor não confundir com uma experiência de atar-se à promessas de ano novo, é muito mais que isso: é definir, com base no que se viveu e no que se é (se é que ainda se “é”) aquilo que se é projeto de si.

O objetivo não é ser lembrado. É não se esquecer.

Um comentário:

  1. enquanto formos as roupas que vestimos... não passaremos de meros produtos na vitrine...

    O ato de estar no palco se tornou mais importante do que a "construção" do próprio personagem (por "construção" entenda aquilo que realmente somos - realmente somos? - nossas crenças, posicionamentos ideológicos, enfim...)
    Se posso ser tudo e nada ao mesmo tempo, qual a importancia de me preocupar com o futuro?
    Se posso usar a camiseta de uma banda punk qualquer, sem entender exatamente o que significa isso, pq preciso me preocupar com o futuro? Se eu cansar, é só trocar a camisa, oras...

    Não há uma reflexão profunda sobre "o que sou eu", mas um simples "o que pareço eu".

    Triste é saber que isso se estende pra todos os planos... Se admito o meu próprio eu fragmentado e superficial, o que dirá das relações que construímos com o outro? É então que palavras como solidariedade se fazem apenas como termos cujo significado só se entende por sua explicação no dicionário...

    Escrever nossa biografia olhando para o futuro é um exercício muito difícil, eu diria, pois requer a "boa vontade" da autocrítica cotidiana... Aquilo que somos hoje, reflete no que seremos amanhã...
    Difícil, porém necessária...

    A reflexão que este post traz é muito importante pra pensarmos nossa conduta em muitos aspectos... pq querendo ou não, creio eu, chega um momento que cansamos de representar... e quando a máscara cair? Serei eu de verdade?

    Amanda.

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