No dia 13 de outubro de 2011, na USP São Carlos, teve lugar o I Ciclo de Estudos sobre Vegetarianismo e Ética, realizado pelo GEEA - Grupo de Estudos de Ética Animal (geea@gmail.com). Aqui deixo algumas imagens e reflexões que tive do evento, constando que são opiniões, críticas e elogios, sendo responsável por eles.
O evento começou com a exibição do filme "Vegana". A produção do filme durou dois anos, e é uma realização do Instituto Nina Rosa. A animação tem como inspiração gráfica o famoso Persépolis. Narra a história de uma garota adolescente (Luca) que é vegana (como sua tia, que é amiga e confidente no filme) e que - sugere-se - é um ponto de pressão em sua família não-vegetariana. Aos poucos, a família começa a enxergar o ponto de vista vegano, sendo colocados diversas vezes em situações de conflito ético. O filme é composto por vários curtas - mas como um todo seria a trajetória de percepção da família para o ponto de vista vegano da filha.
Trecho de "Vegana" |
Um ponto que me tocou profundamente foi o tratamento dado à questão da denúncia de um carroceiro que maltratou um cavalo. Nessa parte do filme, a mãe de Luca desabafa com a filha sobre a situação que viu e sobre como se sentiu impotente. Luca liga para sua tia vegana e ela orienta a família a denunciar o carroceiro à polícia.
Aguardei a parte de perguntas e dediquei-me a essa questão. Coloquei que num
Um dos desenhos do PM Vanderlei Pereira, em exposição durante o evento |
Essa percepção "elitista" dos posicionamentos de ALGUNS/ALGUMAS vegs está desatrelada (e muitas vezes mesmo propositadamente) de uma crítica ao sistema CAPITALISTA de produção/desperdício. É confortável se dizer vegan e sentir-se um puta ativista da causa animal... mas esquece da sua própria espécie - logo, se é especista também. Para mim, como quis deixar claro lá, denunciar o carroceiro por sua impostura com o cavalo, PARA A POLÍCIA (e não para alguma ONG ou associação que possa trabalhar com educação e assistência ao ser humano e ao animal) é apenas manutenção da exploração. Mais neoliberalismo nas veias. Tomar a frente PESSOALMENTE também é uma opção.
A discussão sobre o filme não foi longe. Provavelmente esse ponto que levantei foi o ponto mais crítico das perguntas, mas também não foi aprofundado. Certo desalento de me ver tocando num ponto chave sobre ética e não ver reações favoráveis. Talvez não "coubesse" na discussão proposta.
A tarde, tivemos a apresentação de Fábio Chaves, fundador da rede social e de
Fábio Chaves |
Em seguida, o palestrante Christian Saboia, coordenador da Sociedade Vegetariana Brasileira (www.svb.org.br) que tratou da inclusão dos vegetarianos na sociedade. Palestra bastante interessante, perpassando temas como inclusão no mainstream, e indiretamente, hegemonia. Não gostei muito da entonação
Durante a palestra de Saboia |
O Coffee break foi uma gratíssima surpresa, totalmente vegan, preparado pelo pessoal do GEEA - uma delícia, muitas opções e entusiasmou muitxs vegetarianxs e os poucos onívoros que lá se encontravam!
Mesa com Antunes e Vergotti |
Houve um intervalo e tivemos então oficina de receitas veganas, que ficou no
Jéssica, do GEEA, preparando uma Palha Italiana Vegan |
Considerações finais
O evento em si foi fenomenal. Muito bem organizado (ainda mais por ser um primeiro evento do grupo), a organização foi atenciosa e prestativa. O número em torno de 70 participantes também foi um bom número - apesar do número baixíssimo de não-vegs.
Ficou a sensação de ser um passo a mais para ovo-lacto-vegetarianxs que ainda não tinham argumentos para questionarem a exploração animal como um todo (incluindo leite, ovos, relações de outros derivados animais...) e, para mim, a sensação de que o veganismo enquanto movimento não está sendo abordado numa relação de ética com 'E' maiúsculo - lutamos contra o especismo, mas esquecemos (muitas vezes) nossa própria espécie. Ética está na moda, principalmente quando falamos da ética dos outros - mas elaborar a própria Ética é um passo de entrega e de desafio que vai além de seguir o que está sendo proposto: é praticamente reformular o universo. Debates aprofundados sobre os campos da Moral e da Ética e suas diferenças: fica a dica para o ano que vem.
A sensação de restrição "visual" ao campo de possibilidades no capitalismo também foi forte. Não houve sequer uma manifestação que fosse além da lógica capitalista de domínio do mercado, propriedade privada, Estado de direito, leis, polícia e ordem. Mas isso se dá em quase todos os vieses sociais dos quais eu participo - faltaram libertários "assumidos" lá para "causar" essa sensação de que "hay algo aqui que va mal" - e esse algo é sistêmico. De qualquer forma, valeu a pena comparecer e divulgar.
Ano que vem, esperamos, tem mais!
Parabéns ao pessoal do GEEA, aos/as participantes e aos/as palestrantes. Força no grupo de estudos!!
Mesmo eu não estando lá, gostei da sua perspectiva Taz. Tenho pensado muito ultimamente sobre o veganismo; confesso que sei pouco sobre o assunto, mas fico um pouco receosa pq até que ponto não se tornou mais um rótulo? Em que algumas pessoas a utilizam sem nem ao menos saber de fato o seu significado e se tornam arrogantes? Como acontece com o vegetarianismo...claro, é um risco que se corre em todos os aspectos de nossas vidas. Mas é que não acredito que nem o vegetarianismo, nem o veganismo são estágios evolutivos da humanidade. Sou vegetariana, mas cada um sabe o que é melhor para si, não me sinto em um grau elevado. A questão é mais profunda... para mim o lance está em fazer com que as pessoas se questionem de que forma aquele animal chegou ao seu prato. De forma violenta e inserida em um sistema mercadológico por demais cruel e falido. A minha luta pelo menos é essa sabe...estimular problematizações sobre a forma como estamos comendo, andando, conversando, amando, se relacionando, enfim vivendo...
ResponderExcluirOi Taz, sou da organização e gostei bastante do seu texto. Infelizmente não pude assistir todas as palestras com a correria então meu comentário vai ser baseado no que eu consegui ver.
ResponderExcluirConcordo muito com seu comentário sobre o "Vegana". Essa parte me deixou bem incomodado no filme. Geralmente os filmes do Instituto Nina Rosa me deixam com uma impressão meio ruim, tirando talvez o "Não Matarás". Também acho que alguns vegs se tornam arrogantes e defendem muito os animais não-humanos e esquecem os animais humanos, enquanto a ética animal engloba as duas instâncias. Tirar o homem da ignorância e da dor também deveria ser um intuito do veganismo de forma mais ampla.
Obrigado pelos elogios e com certeza ano que vem as coisas vão ficar mais completas e certinhas. Esse ano a gente teve dificuldades estruturais por ser o primeiro evento e pelo grupo estar em formação ainda, mas acho que estamos satisfeitos com o trabalho e parece que as pessoas gostaram. Mesmo que alguns não tenham absorvido tanta coisa durante o evento, acredito que pelo menos foram munidos de ferramentas para procurar novos caminhos.
A gente vai continuar com certeza no ano que vem!
Obrigado,
Abs
[tio.taz] Oi Nívea. Pois é, como vc bem disse, o "rótulo" e o "modismo" estão cada vez mais presentes nas nossas vidas, e muitas vezes nos contentamos apenas com a nossa "auto-adjetivação". Eu já acho que tem que ir além da palavra, além do rótulo, tem que questionar mesmo. Mas hoje tem de tudo... arrogância = ignorância. Sua luta eu compartilho!
ResponderExcluirOpa, Henrique, lembro de ti lá! Compreendo a sensação que teve com outros vídeos porque também compartilho dela. Muito material existente é mais voltado para fortalecer o desejo das pessoas em se tornar vegetarianas do que para basear ainda mais aquelxs que já são vegetarianxs/vegans. Mas é um caminho diretamente relacionado à ética: não existe prescrição para "o que se quer" no campo da ética. Só nos resta continuar assoprando o fogo para termos nossa própria luz.
Parabéns novamente pelo trampo e mande recomendações a todxs do GEEA.
abxxx e valeu pessoal.